quarta-feira, 26 de agosto de 2009

CRÓNICAS DO NOSSO MUNDO

PIM, A LIÇÃO QUE VEIO DO FRIO

Por:

JAIME AZULAY*

Esta é uma daquelas histórias deliciosas que toda a gente gosta de ouvir contar. E aconteceu mesmo, não é ficção. Um simpático bebé-pinguim, vindo provavelmente das águas geladas do Sul, deu à costa nas praias de Benguela. A curiosidade foi geral, as pessoas nunca tinham visto nada parecido. As crianças rapidamente baptizaram-no de "Pim" e escolheram-no como companheiro para as brincadeiras.

Afinal, como o “Pim” conseguira chegar até aí? Contaram que os pescadores o tinham capturado durante uma noite sem luar, enquanto lançavam as suas redes na enseada do morro do sombreiro. Na escuridão tomaram-no por um pato de água. E, como pato foi vendido à uma mamã-peixeira pela soma de 500 Kuanzas. A vendedeira meteu-o no cesto que levava à cabeça e seguiu para o pregão habitual pela cidade: “olha pexe, olha pexe, hoji tem pato tambééé! o dono de uma explanada à beira-mar, sr Adalberto, nunca tinha visto peixe e pato misturados numa única cesta. Resolveu indagar do que se tratatava. Ajudou a baixar o cesto, quando ouviu a peixeira gritar:- “Aiué mano, essi pato está mi comer o mó pexe”! – “Ó mana, isso não é pato”, retorquiu o Adalberto. Retiraram o bicho da cesta. Estava envolto em areia, algas e barro, mas de pronto se concluiu que pato aquele bicho não era. Uma lavagem com água, resolveu a questão da identidade: era um pinguim elegante, com o seu tradicional fraque preto e branco.Toca a baptizá-lo no meio da algazarra das crianças e o olhar curioso dos adultos. Ficou mesmo "Pim". Assim passou a ser tratado. No restaurante construiram um tanque para o pinguim. Passou a ser a atracção e teve honras de reportagens na tpa. Com os holofotes apareceram os “experts.” Uma anciã relatou o caso de 2 pinguins que deram à costa aqui, há mais de 40 anos. Ela revelou que, por indicação de um estudioso da época, os dois animais foram metidos numa arca frigorífica por causa do calor e acabaram por morrer…de frio.

A ciência afirma ser raro encontrar pinguins em latitudes tropicais, com excepção dos Gálapagos, por onde passa a corrente fria de Humboldt, vinda do Antártico. A costa ocidental sul-africana poderia ser o origem do "Pim", arrastado em grupo pela Corrente Fria de Benguela, durante uma perseguição à cardumes de peixe. Um encontro com focas ou outro predador, poderia ter dispersado o grupo e esse pinguim ficado perdido. É o chamado "Pinguim Burro", que emite um som parecido com o zurrar do jerico. Têm o nome científico de "Spheniscus Demersus". Havia ainda hipótese do pinguim ter sido capturado nos mares do Sul, por um navio que, rumando posteriormente para Norte do Equador, preferiu antes jogá-lo ao mar. Afastadas as cogitações, o certo é que muita gente ia ao bar do Sr. Adalberto ver o Pim. As crianças tomavam refrigerante e os mais velhos ficavam nas mesas a beber cerveja. O “Pim” alimentava-se de peixe miúdo e era um comilão. Deglutia 2 quilos por dia, o equivalente ao seu próprio peso.

“Vem aí o calor, será que o pinguim sobreviverá?”, perguntavam os mais sensatos. Um ambientalista de ocasião vaticinou que a pouca idade favoreceria a adaptação. O Sr. Adalberto foi aconselhado a dar uns mergulhos de mar ao pinguim. O “Pim” passou a nadar no mar da praia morena. Incrivelmente, ele parecia resignado ao seu estatuto. O dono libertava, o pinguim nadava. Depois voltava e era levado para o tanque no bar. Passaram-se semanas, o animal estava domesticado, ninguém duvidava.

Um dia o Sr. Adalberto levou o “Pim” para o habitual mergulho. Nessa manhã o pinguim não voltou para as mãos de quem o considerava seu dono. Esperaram minutos, horas, em vão. O sol baixou por detrás do sombreiro e veio a noite. O mar ficou escuro na linha do horizonte,como se quisesse esconder o “Pim” dos holofotes humanos. Nas profundezas do oceano um ser reconquistara o valor sagrado da Liberdade.(FIM)

*Estudante do Curso de Direito

Sem comentários:

Enviar um comentário

A sua opinião conta e nós contamos com ela.

Arquivo de Notícias